Eleições 2018: menos mulheres na política?

Ministra Rosa Weber, PGR, Raquel Dodge, senadoras, deputadas e advogadas após sessão do TSE. Foto: Rita Polli / Procuradoria da Mulher do Senado

A redução do tempo de campanha eleitoral, as restrições à propaganda, a proibição de doações de pessoas jurídicas, as regras fluidas relativas à utilização do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas, a necessidade de eleger o maior número de deputados – até para usufruir, no futuro, de mais tempo de televisão e mais recursos do “Fundão” – tudo isso conspira para que os partidos políticos privilegiem, nas próximas eleições, a busca pela reeleição de seus atuais parlamentares. Essa é uma péssima notícia para a representação política feminina, pois, na Câmara dos Deputados atual, por exemplo, não há mais do que 15% de mulheres. Se toda a Câmara for reeleita, o percentual de mulheres será apenas mantido, mas corre-se o risco, nas próximas eleições, de que essa bancada feminina seja reduzida.

As mulheres têm estado no âmbito invisível da política.

Com o tempo de campanha reduzido, possuem mais chances aqueles candidatos que já são conhecidos e contam com redes de contato (e, às vezes, de clientelismo) em suas regiões de origem. Quarenta e cinco dias é um período muito curto para que novas lideranças e novos talentos se apresentem ao eleitorado, tanto mais, diante de regras de propaganda eleitoral restritivas.

Vem, então, a questão do dinheiro. A proibição das doações de pessoas jurídicas atendeu à percepção de que estes valores, com certa frequência, eram dados em troca de favores futuros, configurando abuso de poder econômico. É uma verdade que levou o Supremo Tribunal Federal à solução radical da proibição pura e simples das doações empresariais. As alternativas, a previsão de um limite fixo para as doações, independentemente do faturamento da empresa, e a permissão de apoio financeiro a um único candidato por circunscrição, dependem de uma atuação legislativa que ainda não veio.

Daquela proibição surgiu o “Fundão”. Cerca de 1,7 bilhão de reais foi dado aos partidos políticos, sem regras específicas para sua utilização, a ser decidida pelas instâncias partidárias1. Embora pareça um valor imenso, na prática, diante do número de candidatos majoritários e proporcionais Brasil afora, não é. Se o propósito do legislador é incentivar o financiamento público das campanhas, mais terá que ser feito. As doações de pessoas físicas – um bom exemplo de participação cidadã – ainda precisam se firmar para que os custos da política sejam alcançados.

Dentro de sua esfera de autonomia, os partidos vão priorizar candidatos que apresentem boa chance de êxito. Poucas vezes serão mulheres. Algumas concorrerão apenas para aumentar o quociente partidário e não, efetivamente, para serem eleitas. Em estudo com a advogada Karina Kufa, um dos autores desse texto sugere que para os candidatos eleitos exclusivamente graças aos votos partidários, haja alternância de gênero2.

Foi necessária e adequada a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, de 22 de maio deste ano, de determinar que ao menos 30% dos recursos do Fundão sejam aplicados em candidaturas femininas. Todavia, por falta de critérios legais, divisa-se situação na qual partidos empregarão todo o dinheiro da quota feminina em favor de uma única ou de umas poucas candidatas. Não há esperança de que os recursos cheguem para todas e façam a diferença em suas campanhas.

Se até aqui o cenário não é promissor, não se pode olvidar que, nas eleições passadas, dos cerca de quinze mil candidatos que pediram o registro e tiveram a votação zerada, quatorze mil eram mulheres. O expediente das candidaturas fictícias, mulheres cooptadas para, tão-somente, fazer número e cumprir o percentual legal, mostra a distância que existe entre a vida partidária real e efetiva e a perspectiva de um parlamento mais igualitário. Ainda que os rigores da lei sejam aplicados a esse tipo de fraude, ela evidencia que a política brasileira não tem conseguido ser atrativa para os talentos femininos.

O ambiente partidário mostra-se comumente inóspito para mulheres. É notável que sejam majoritariamente elas a apontar, entre as dificuldades em fazer política, a necessidade de cuidar dos filhos e manter a vida familiar. É um dado da realidade que mostra a influência de papéis sociais tradicionais e a insuficiência das medidas atuais de afirmação da política no feminino.

Defende a filósofa Nancy Fraser, que a Justiça requer tanto redistribuição como reconhecimento, contemplando demandas pela igualdade social e pela compreensão das diferenças. É o que chama de “política do reconhecimento”: trazer à lume perspectivas diferenciadoras de minorias étnicas, raciais, e sexuais, assim como da diferença de gênero3.

A desigualdade entre homens e mulheres é transparente. Nos dizeres de Ulrich Beck, ela tornou-se pessoal, cotidiana e ilegítima, e como, consequência, política. A equiparação entre homens e mulheres não pode vingar em estruturas institucionais que se sustentam na disparidade.4 Falar em igualdade da mulher na política é defender a sua condição de livre agente, como promotora dinâmica de mudanças sociais que podem melhorar a vida das mulheres e também dos homens.

O sistema político ainda se compraz em tornar invisíveis as minorias ou, no caso das mulheres e dos negros, uma maioria. Invisibilização é poder: exercício e reconstrução de relações de poder hierárquicas5. Ocupar determinadas esferas outorga poder: de compra, de reclamação de direitos, de negociação, de definição das prioridades econômicas.

Índices maiores de igualdade de gênero – e, também, de raça e etnia, da comunidade LGBT, de populações tradicionais – são uma mostra da vitalidade democrática de um país e de estruturas político-eleitorais hábeis para representar o conjunto da sociedade. Menos mulheres é um sinal de que extensas mudanças são necessárias.

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Fonte: JOTA Info

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